AUTOR

Daniel Duque

CATEGORIA
Entrevista

Magazino: “Sinto-me mais motivado do que nunca”

2 Dezembro, 2019 - 12:15

Em jeito de antecipação do seu 24º aniversário de carreira, estivemos à conversa com o experiente DJ Magazino.

São largos os anos que separam as primeiras aventuras de Luís Costa na cabine, em que se apresentara como Del Costa, e o incontornável mundo de Magazino, alter-ego reconhecido nacionalmente como um dos mais sérios nomes da cena eletrónica em Portugal.

Há quatro anos, no Station, em Lisboa, Magazino celebrou 20 anos de carreira com um set de 20 horas. Agora, o desafio é maior: das 10 às 10h, entre sexta-feira e sábado, o português fica responsável por tocar durante 24 horas. Para isso, irá contar com o suporte de alguns convidados, dos quais se conhecem, à data, Cruz, Gusta-vo e Anah.

Antes desse evento, que se prevê como um autêntico marco na nossa história, trocámos algumas palavras por telefone com o homem natural de Setúbal. Lê abaixo a nossa entrevista, na qual se aborda, entre outros temas, o balanço destes últimos anos e a preparação necessária para um set desta dimensão.

Já estás por Viena? Vais passar discos esta noite [sexta-feira, 29 de novembro]?
Amanhã, sim. Vim mais cedo para conhecer a cidade porque nunca toquei aqui, tenho muitas boas referências da cidade. São novidades.

Deste lado fica a ideia de que tem sido um ano em cheio…
Tem sido, por acaso tem sido mesmo… Eu já viajei muito na minha carreira, mas este ano acho que foi o ano em que viajei mais. Há 15 anos viajei muito pelos discos que fiz, agora tem sido mais por – eu acho – redes sociais, internet, vídeos de mim a tocar… mais por aí.

Mas mais importante do que este ano são os últimos 24 de carreira. Qual é o balanço que fazes destes anos todos?
O balanço que faço só pode ser positivo. Só o simples facto de estar a tocar há 24 anos e conseguir viver daquilo que gosto de fazer… É muito bom, atendendo a que a grande maioria dos meus amigos não faz aquilo que realmente gosta – tem um trabalho, pronto. Isto para mim é um trabalho, sem dúvida, mas é um trabalho que me dá prazer de fazer. E continuo a ter muito prazer em fazê-lo, muito prazer em subir às cabines e ainda me dá um frio na barriga ao fim de tanto tempo. Até porque também a maior parte das vezes é em sítios diferentes, nunca é igual. É sempre um desafio.

Na altura da celebração dos 20 anos, por causa das 20 horas de set, falaste da preparação necessária, até física. Tens feito muito exercício?
Só mental; físico, vou-te confessar, tenho feito pouco porque tenho estado a viajar todos os fins de semana. Não tenho conseguido fazer ginásio ou… Tenho feito muitas caminhadas no estrangeiro, isso tenho [risos], mas não é o adequado. Mas tenho feito sobretudo exercício mental para poder levar as 24 horas de forma a que não fique completamente extenuado no fim. E pronto, tenho feito outro tipo de preparação, que é a parte da música, a mais importante. Tenho separado já muitos discos, mas ainda me faltam alguns. Na segunda-feira, quando chegar a Lisboa, vou dar um remate final nos discos que vou tocar na próxima sexta-feira.

São cerca de 400?
Sim, vou separar cerca de 400. Não que os vá tocar todos, porque o normal será tocar por volta de 300, mas prefiro ter sempre diferentes hipóteses por onde ir.

É um processo muito demoroso, este de escolher esta quantidade de discos?
É. É porque tenho imensos discos, uma coleção muito grande, alguns milhares. E então, a escolher discos – ainda por cima vai ser transmitido em streaming, vai ficar gravado para memória futura – quero que sejam mesmo discos especiais, e sobretudo quero também que sejam discos que, na maioria, senão na totalidade, não toquei há quatro anos nas 20 horas.

Mesmo que seja um processo que dê algum trabalho, suponho que dê prazer também.
Sim, dá prazer porque é da maneira que até consigo recuperar, fazer digging na minha própria coleção. Porque é o que eu faço diariamente, faz parte do meu trabalho fazer digging, seja no Discogs ou por esse mundo fora, às lojas que vou – ou às caves, que às vezes caves que são lojas repletas de discos. Faz parte da minha profissão. Mas dentro da minha própria coleção achar discos que eu julgava, há cinco anos ou mais, que nunca mais os iria tocar, recuperá-los é muito gratificante, é mesmo muito bom.

Existe algum disco que, mesmo antes de começares a fazer digging, se calhar já saibas que o queres levar?
Não concretamente. Sei que há discos que vou querer tocar, e que vou tocar mesmo, porque são discos que me têm acompanhado no último ano, ano e meio, dois anos, e que são imprescindíveis nos meus sets atuais. E como é óbvio vou tocá-los, vou procurar tocá-los mais para o fim talvez, porque há de ser o peak time, entre a meia-noite as 10 da manhã – as últimas 10 horas, vá. Mas não tenho assim nada… Consoante vou vendo, é da maneira que vou sacando os discos.

Na altura dos 20 anos, também li que – e é normal, claro – viajaste por diferentes sonoridades. Suponho que aqui a ideia seja a mesma…
Nos 20 anos, de facto fiz uma retrospetiva da carreira e dos discos que consumia na altura, e das diferentes fases que passei – já toquei mais soulful house, garage, techno, hard techno, já passei por essas fases logo no início da carreira. Agora nestas 24 horas não vou por aí, vou tocar aquilo que eu ando a tocar recentemente, entre o house e o techno, porque é a área por onde me movo. É por aí, não vou buscar clássicos do passado porque não sou saudosista do passado [risos]. Apesar de tocar muita música antiga, toco música antiga que não é do conhecimento geral porque são discos que as pessoas pensam que são discos novos, ou que ainda não saíram, portanto a ideia é essa. Não gosto de tocar clássicos orelhudos, que são logo reconhecidos à partida.

Outro pormenor é que vais levar contigo alguns convidados – acho que para já é só o Cruz e o Gusta-vo confirmados…
Exatamente, mas vou levar mais três, que depois vou anunciar. Para já o Cruz porque é meu sócio já há 10 anos na Bloop, e já é meu amigo há muitos anos, é meu companheiro de viagem e batalhas, portanto faz todo o sentido. E o Gusta-vo porque também tenho uma relação de amizade há muitos anos, inclusivé vivemos juntos no Porto, numa altura em que eu vivi na cidade. Mantivemos a amizade e respeito imenso aquilo que ele faz, e dou-lhe muito valor pelo que já conseguiu com toda a estrutura que criou, desde o Neopop e o booking para outras grandes festas. Enquanto artista tem imenso valor – não que a nossa música se cruze muito, mas aí também está um desafio interessante porque ele sempre tocou muito boa música, sempre foi muito digger, mas, apesar de não se cruzar muito, é um desafio encaixá-lo ali um par de horas comigo a tocar nestas 24 horas.

Como é que isso se vai desenrolar com os convidados, tens horas definidas ou…?
Sim, sim, vou definir as horas. Aliás, as horas já estão definidas na minha cabeça, estou só a ajustar porque um dos convidados vem de fora, e então tenho de ajustar o horário. Vou anunciar os horários, não é à toa, vai ter uma lógica.

As primeiras 12 horas são de entrada livre. Já te ouvi a falar de “paraquedistas”, não é algo que tenhas receio neste caso?
Já me ouviste falar em paraquedistas e ouviste bem, sim, porque o propósito inicial da Bloop foi fazer eventos em sítios inusitados, fora de clubes e discotecas, e num horário também fora do normal, durante o dia. Porque à noite toda a gente sai, e muitas vezes estão lá pessoas que vêm pedir outro tipo de música que não eletrónica. Esse era o propósito inicial, e conseguimos concretizá-lo com considerável sucesso.

Relativamente aos paraquedistas que estás a falar e a entrada livre, o edifício tem dois pisos, o piso de baixo tem uma esplanada em frente ao rio e… Não é um sítio que durante o dia vá lá alguém por acaso, vai quem quer ir dar-me um abraço, ou visitar, ou curtir um bocado de boa música… E então não tenho receio de paraquedistas porque quem lá vai sabe ao que vai, de certeza.

Em jeito de remate, gostava de te perguntar como é que encaras 2020, que está aí à porta.
Enquanto DJ – nesta reta final de 2019 estou a ter gigs para tocar em todo lado, inclusivé fora de Portugal; aliás, até mais fora de Portugal pois em Portugal faço o circuito dos clubes que acho que são de ponta, assim como festivais – as confirmações que tenho para 2020 já me deixam feliz. Perspetivo 2020 como um ano ainda melhor, atendendo à quantidade de gigs que tenho tido, especialmente no estrangeiro, eu acho que ainda vou ter muito mais trabalho no estrangeiro porque acho que o meio onde me movo é um bocado de nichos, e é pequeno, e quando entras no meio a palavra começa a espalhar. Acho que é isso que tem acontecido e tenho recebido propostas para tocar em sítios que nunca tinha ido, países onde nunca tinha tocado – por exemplo, daqui a duas semanas vou tocar à Rússia, onde toquei muitas vezes, mas já não ia tocar à Rússia há 10 ou 11 anos. Ou seja, acho que é um reflexo do trabalho que tenho feito enquanto DJ porque… não sei, acho que tenho tido mais visibilidade nas redes… sei que tenho notado esse acréscimo significativo de pedidos para tocar, especialmente fora de Portugal. Portanto, para mim acho que vai ser um ano muito bom sinceramente. E já é um pouco… Quando fiz as 20 horas, eram 20 horas para 20 anos de carreira, e o nome da noite, ou festa, era o “20/20″… Foi quase um prenúncio, estamos a chegar agora ao ano 2020, portanto acho que vai ser muito positivo.

Já agora pergunto: mesmo depois destes 24 anos de carreira, sentes-te mais motivado do que nunca?
Sinto-me mais motivado do que nunca e vou explicar porquê. Tive uma fase em que sentia gosto em tocar, como é óbvio, mas estava um pouco desmotivado relativamente à música, estava a tocar mas não sentia prazer ao domingo quando chegava a casa, e vontade de ouvir música como agora sinto. Há cerca de três anos, houve um volte-face – tive mais contacto com um artista que admiro imenso, o Francesco del Garda, passei uns dias com ele e ele abriu-me bastante os horizontes. A partir desse momento, reganhei um querer e uma vontade imensa de tocar, e de mostrar coisas que as pessoas não conhecem. A partir daí, fiquei muito mais motivado, sinto-me neste momento mais motivado do que nunca porque sinto uma confiança plena naquilo que estou a tocar, derivado também de todo o trabalho intenso de pesquisa e digging que tenho feito. Há uma coisa que garanto às pessoas que me vão ouvir, seja no Porto, Lisboa, onde quer que seja: quando me vão ouvir, de certeza que vão ouvir música que nunca ouviram e que jamais vão ouvir. Seja ela de 95 ou de 2020 – porque tenho discos de 2020 que já estou a tocar – isso posso eu garantir. É esse o meu mote: vão ouvir música que nunca ouviram. Algum tema dos muitos que toque nesta sessão de certeza que nunca ouviram e, muito provavelmente, jamais irão ouvir. É por isso que eu trabalho.

Fotografias por Rúben José e André Teixeira, respetivamente

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