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Entrevista

Dub Tiger: “Nós quisemos, em primeiro lugar, recuperar esse espírito do amor à música”

7 Junho, 2019 - 16:30

No âmbito do terceiro aniversário do Kremlin, que acontece este sábado 8, estivemos à conversa com Filipe Martins, também conhecido por Dub Tiger.

O Kremlin é hoje uma referência incontornável da cultura eletrónica portuguesa, tanto pelo seu passado como, agora, pelo seu presente. Abriu as portas pela primeira vez em 1988, e rapidamente se destacou pela oferta musical inovadora para a época. Em 1995, a revista britânica Muzik destacava mesmo o Kremlin num artigo intitulado “A Paradise Called Portugal” (“Um paraíso chamado Portugal”), onde celebrava também veteranos Vibe, Mário Roque ou Jiggy. Terminados os anos 90, o clube começa a perder popularidade e, na sequência de alguns episódios de violência, encerra mesmo as portas em 2011, ficando apenas a funcionar pontualmente para alguns eventos privados. Em 2016, volta a abrir as portas com uma nova equipa e um novo conceito que, segundo a The Press Boutique, fizeram novamente do clube “um local de peregrinação às sextas e sábados”.

Dia 8 de junho, o Kremlin festeja o seu terceiro aniversário desde a reabertura, com Gonçalo a atuar como convidado de honra. Para assinalar a data, A Cabine esteve à conversa com Filipe Martins (aka Dub Tiger), um dos responsáveis por trazer de volta este espaço mítico da noite lisboeta.

O Kremlin foi, durante muitos anos, a mais importante discoteca do país na vertente da eletrónica. “Ressuscitá-lo” foi, sem dúvida, um enorme desafio a que se propuseram, no início de 2016. Quais as maiores dificuldades e conquistas neste processo?
Quando tomámos a decisão sabíamos que ia ser um desafio. O Kremlin faz parte da história da cidade e decidir reabri-lo, depois de um período de encerramento tão longo, foi uma decisão arriscada mas calculada, porque sabíamos a mais-valia que podíamos trazer enquanto profissionais do meio, melómanos, com carreiras já com décadas de actividade na área.

Durante alguns anos, com o encerramento de casas como o Alcântara Mar e depois o Kremlin, as pessoas que gostam de música eletrónica ficaram com poucas (ou nenhumas) opções em Lisboa. A única escolha, durante um determinado período, eram os eventos pontuais realizados por diferentes produtoras em locais variados. Nesses eventos existe sempre um cartaz reforçado com internacionais e, com isso, perdeu-se o culto de ir a um clube apenas pela música. Nós quisemos, em primeiro lugar, recuperar esse espírito do amor à música.

A maior dificuldade que sentimos no início foi a de trazer as pessoas ao clube sem ter um internacional a atuar, exatamente porque se tinha criado esse hábito na cidade. A maior conquista é termos conseguido com que o clube funcione apenas por ele mesmo, e a procura, mesmo por estrangeiros, é cada vez maior pela notoriedade que o clube retomou nestes três anos.

Frequentavas o Kremlin nos anos 90? Quais as diferenças mais acentuadas entre essa e esta altura? Como é que a tua relação com o clube evoluiu até chegares aqui – dj residente, manager e responsável pelos bookings?
Sim, frequentava assiduamente. São perspectivas diferentes, e poderíamos debater este tema longamente. Primeiro, falamos de uma época em que tudo era novidade para todos, e em que penso que havia mais receptividade para algo que não conhecíamos num tempo em que não havia tanta, e tão rápida, informação como hoje. O cenário mudou, Lisboa tem muito mais pessoas de diferentes origens hoje do que nos anos 90, a música também mudou e os protagonistas também. Penso que é complicado estabelecer um paralelismo entre o passado e o presente.

A minha relação hoje é outra: nos anos 90, era cliente assíduo, e penso que isso hoje me dá a vantagem de me conseguir colocar no lugar de quem frequenta o clube. Evidentemente que, como cliente desde o início, tenho um “carinho” especial em todas as decisões. Queremos inovar e evoluir mas sempre com o cuidado de não fugir muito das origens. Inovámos em som, cabine, imagem e luzes, mas com o cuidado de não mexer na estrutura da casa original, que é conhecida, por exemplo, pelos inconfundíveis arcos em pedra. Trata-se, no fundo, de construir o futuro sem desvirtuar o passado, mas antes honrando-o em todas as decisões tomadas.

A música eletrónica está de novo “na moda”, e a oferta é cada vez maior – novas editoras e coletivos, mais artistas, mais festas e eventos a acontecer. Como é que o Kremlin se posiciona e diferencia dos restantes clubes em Lisboa?
Aqui voltamos à primeira pergunta, e à nossa opção de primar pelo clube e pela oferta enriquecedora dessa experiência. Não nos podemos focar apenas no cartaz, até porque, no que diz respeito à oferta de música eletrónica em Lisboa, esta vem principalmente de produtoras, e não de clubes. Como há muito poucos clubes de música eletrónica, preocupamo-nos em fazer o nosso caminho sempre com tendo em conta o essencial: quem escolhe o Kremlin como clube de eleição para ouvir boa música.

A festa do terceiro aniversário vai acontecer já este sábado, dia 8, com um line up 100% português – Gonçalo (que está a comemorar 20 anos de carreira) , Dub Tiger e Tomaz Gee. É um cartaz ilustrativo daquilo que é o Kremlin?
Estamos convictos que sim. O Gonçalo vem reforçar o cartaz e vai de encontro àquilo que temos feito ao longo destes três anos, oferecer algo novo e abrir portas a talentos que têm tido pouca atenção do nosso mercado, principalmente nacionais. O restante cartaz é a prata da casa, e as pessoas que nos têm visitado têm-se mostrado contentes com o resultado.

Que balanço fazes destes três anos do “novo” Kremlin? O que podemos esperar para os próximos três?
Estes três anos superaram todas as nossas expectativas. Tanto o meu sócio, Fernando Rodrigues, como eu, sabíamos que não seria um desafio fácil, mas sempre acreditámos na nossa visão do Kremlin e trabalhámos coerente e consistentemente. Podem esperar novidades, porque apesar do ditado afirmar que “em equipa vencedora não se mexe”, o comodismo não faz parte do nosso dicionário!


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