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Lançamentos favoritos de março

9 Abril, 2021 - 15:44

Ainda vamos a tempo de celebrar a música de março.

Aurora Pinho – Flesh Against Flesh

É o segundo álbum da artista multidisciplinar feirense Aurora Pinho. É um álbum elástico, fluido, intenso e, acima de tudo, um retrato fiel e assumidamente militante do que é lutar pela liberdade de se ser quem é. Apesar de representar uma ruptura de fronteiras e uma nova etapa, “Flesh Against Flesh” é também um retorno às sonoridades primordiais de Aurora Pinho – r&b, hip hop e eletrónica – fundidas num extenso manifesto musical à liberdade repleto de valiosas colaborações.

DJ-Kicks – Special Request

Este é um lançamento com características particulares, ao bom modo da DJ Kicks. Os temas, por si só dignos de escuta independente, resplandecem quando servidos em mix. A responsabilidade é do experiente Paul Woolford, que coloca a sua genialidade técnica ao serviço de muitos dos seus temas favoritos de sempre. Do house ao techno, passando pelo electro, disco ou jungle. Clássicos e inéditos. Uma espécie de resumo da longa noite que todos nós estamos a precisar e das várias emoções que a música pode albergar.

David From Scotland – Hooligan’s Heart

David Félix começou David From Scotland como um projeto a solo há alguns anos, mas rapidamente Diogo Barbosa tornar-se-ia peça-chave desta dupla portuense que viaja entre os anos 80 e a frescura da atualidade. Em março, chegou o primeiro álbum do duo, “Hooligan’s Heart”. É um disco que, mais do que o lado sónico, conta uma história sobre como até o mais duro dos corações se quebranta. É o medicamento ideal para dar fôlego aos dias de hoje através da sua viciante receita composta por vozes como EVAYA, Gil Jerónimo ou Vítor Pinto e remixes de Rita Maomenos ou Dupplo.

Etari – Rainbow Eucalyptus [100% Silk]

Hypno-house, eco-tech ou blissed-out house. Estas foram algumas das classificações usadas para definir as sonoridades deste álbum polirrítmico, da DJ e produtora de LA Etari. Mas achamos que o da própria editora, 100% Silk, resume-o na perfeição – “8 hinos para tendas chill-out agitadas”. Na mouche. PS: Aproveitem para espreitar o vasto catálogo da 100% silk – cá para nós, é um mimo.

Floating Points, Pharaoh Sanders, LSO – Promises [Luaka Bop]

É difícil arranjar um exemplo recente que tenha causado tanto impacto e hype nos media e nos fãs como este “Promises”. Por isso, de certa forma é também difícil perceber se há algum problema epistemológico que tenha influenciado o facto de os nossos corações se derreterem ao ouvir este disco. Mas a verdade é que é um belíssimo trabalho. Seja pela linha condutora presente ao longo dos nove “movimentos”, pelo saxofone de Pharoah Sanders, pelos sintetizadores de Floating Points ou pelos apontamentos da Orquestra Sinfónica de Londres, “Promises” dá muito espaço e liberdade aos intervenientes para brilharem. E às nossas sinapses também.

IKOQWE – The Beginning, the Medium, the End and the Infinite [Crammed Discs]

Por aqui junta-se o rapper e ativista angolano Luaty Beirão, aliás Ikonoklasta, ao compatriota Pedro Coquenão, ou Batida. É preciso dizer mais? Então cá vai: é um álbum conceptual, uma história de dois nomes (Iko e Qwe) que chegam de outra dimensão para conhecer o mundo secular, comunicando o que observam em línguas de música de dança ou hip-hop através de drum machines, field recordings do etnomusicólogo Hugh Tracey ou instrumentos angolanos. É um disco bem conseguido que poderia perfilar nesta lista apenas pelos instrumentais de Qwe, mas as vozes e letras baseadas na atualidade de Iko são o remate perfeito.

INSEON – ESPR

O álbum de estreia de INSEON, cognome para o output musical de David Henriques (que é Relapso e já editou como NISS), é “ESPR”, um tributo póstumo à luta pela vida e à falecida mãe da esposa do autor. “ESPR” é uma fusão artesanal entre uma pianada reverberante e sonoridades ambient, envoltas em permanência numa aura cinemática. Simples na aparência mas complexo na sua essência, “ESPR” é um álbum cheio de surpresas que pede para ser escutado mais que uma só vez.

L’Impératrice – Tako Tsubo [Microqlima]

Depois do sucesso de EPs como “Sonate Pacifique” e do álbum “Matahari”, eis que o sexteto francófono lança finalmente “Tako Tsubo”. É um álbum “de ruptura”, como a própria banda o descreve, com 13 faixas a não perder, sendo algumas delas reinterpretações de canções já conhecidas da banda, que conquista cada vez mais terreno no panorama francês e internacional. “Tako Tsubo” é um sucessor mais que digno de um historial vasto de música de qualidade, com particular destaque para performances que não só primam pela qualidade musical como também pela adaptação virtual ao contexto peculiar que a indústria musical atravessou com a pandemia.

Lavoisier’s Law – Slow Remixes (Drone Nocturnes) [Black Hole Time Warp]

Num lançamento incontornável para fãs de eletrónica experimental e música clássica, Isaque Andrade (Lavoisier’s Law) funde algumas das Nocturnes de Chopin com reinterpretações desaceleradas e carregadas de glitch tenebroso. Depois da obra de Ravel, que adaptou com tonalidades de dub experimental em “Dub Impressions”, o músico e artista visual lança-se num novo desafio: reinventar Chopin através de um novo manto de escuridão sonora.

Opus Pistorum – Herbáceas [Linha Amarela-Produções]

Hélder Menor, figura central do neuro-dance barreirense e da Linha Amarela-Produções, traz-nos “Herbáceas”, um álbum que se expande por novos horizontes. Regando as suas oito plantas musicais com sonoridades ambient ou drone e até com uma guitarrada de João Pedroso (na primeira faixa), é um álbum que, mais do que uma “exaltação da natureza”, é “um grito de amor a todas as formas de vida que insistem a lutar umas pelas outras”. Nas palavras do próprio artista: “quando resistir é vencer, a vitória é inevitável”. E aqui vence-se.

Prince Apache – Planetary Loves [Release/Sustain]

A espiritualidade do EP de estreia de Prince Apache obriga-o a desfilar na nossa lista de lançamentos favoritos de março. O português, que produz música há cerca de 12 anos e é mais conhecido por Himan, bem avisou que este trabalho é diferente do que tem vindo a fazer até então. Há sintetizadores melancólicos, linhas de baixo frisantes, mas não só. A música é, sobretudo, espacial: faz-nos navegar e é certo que nos deixa em bom porto. A escuta é obrigatória, a viagem inevitável.

Rabu Mazda – Tá Sempre Pegando Fogo [Discos Extendes]

Depois de se estrear a solo no ano passado com “Todo Mundo Sabe”, Leonardo Bindilatti lançou no mês passado um vibrante e incendiário EP pela Discos Extendes. “Tá Sempre Pegando Fogo”, disponível também em vinil, está repleto de referências deste porta-estandarte da Cafetra Records – baile funk, footwork e muito mais – com samples, acordes ou ritmos cuidadosamente trabalhados para pôr sistemas de som e pistas a arder. Resta-nos esperar pelo primeiro álbum enquanto ficamos a observar o fogo repetidamente.

Uc Beatz – 803 Crystal Grooves Collective Cuts, Vol. 5

Depois da contribuição com uma faixa para o volume precedente a este, o belga UC Beatz regressa à sub-label da maga do house refinado Cinthie. Aqui há house para tudo e todos. Do mais jazzy fluido de Bongos, Rhodes & Candles, à selvajaria mais clássica/primordial de Wild Horse, passando pelo jogo percussivo de Sunshine on my mind antes de um retorno ao jazz (desta feita, mais acídico) de Vertigo, que finaliza o EP com a cordialidade devida. Um verdadeiro pitéu.

Witch Trials – Habitual Martyr [MYRYRS]

Se o ambiente festivo te cativa, o 4/4 clássico banger te deslumbra, e o big time techno é a tua praia, então passa este lançamento à frente. Em “Habitual Martyr”, Witch Trials segue a filosofia que implementou nesta sua nova editora rumo a um conceito orientador, com foco na mistura de géneros e o encorajamento pelas vias arriscadas. Ambient sombrio, broken beats, techno (bem deep e dark), dub e muita experimentação, são o resultado de um trabalho de dois anos, numa espécie de banda-sonora ao “ciclo de mudanças pessoais, de crescimento, e do ambiente claustrofóbico de um espaço mental desordenado”. Quem diria que a melancolia e a pujança ficassem tão bem juntas.

ZZY – Asylum

Depois de nos ter chamado a atenção com sonoridades jazz, José Veiga tem vindo, desde a edição de “Disorder”, a explorar um lado mais íntimo e introspetivo nos seus trabalhos. A sua preocupação em abordar a (in)sanidade mental é agora, mais do que um desejo, um traço indissociável da eletrónica que prescreve. Ao longo das nove faixas que compõem o seu novo álbum, “Asylum”, o barreirense faz uso de estilos como dubstep mais escuro para minuciar uma viagem até ao subconsciente. Por cá, também nós procuramos um lugar de refúgio contra a intempérie.

Textos por Daniel Duque, David Rodrigues, Nuno Vieira e Rui Castro

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