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Lançamentos favoritos de abril

10 Maio, 2021 - 18:47

Em abril, discos mil. Mas só escolhemos 14 que não conseguimos largar.

Andy Stott – Never the Right Time [Modern Love]

Seja pelos momentos mais introspetivos (Dove stone, Don’t know how) ou até por outros que podem ser ouvidos soltos e em diferentes horas, como a bem festiva e progressivamente dançável Repetitive strain, “Never The Right Time” é mais um álbum certeiro para o currículo de Andy Stott. Diz-se por aí que não se compara a outros discos do britânico ou até que não é nada de especial, mas isso pouco nos importa. Importa-nos antes que este álbum foi uma excelente companhia durante abril, envolvendo-nos por completo na voz de Alison Skidmore e no quadro que vai sendo pintado por Stott ao longo de 40 minutos.

CZN – Luxury Variations [The Trilogy Tapes]

Dois dos mais excitantes bateristas e percussionistas (se calhar isto é um pouco suspeito, mas adiante) voltaram a lançar um disco como CZN, novamente com toques do produtor Leon Marks e masterização de Alex Gordon nos estúdios Abbey Road. Falamos do portuense João Pais Filipe e da italiana Valentina Magaletti, mestres em transportar cérebros daqui para um qualquer outro lugar – não sabemos bem se para o espaço, se para uma tribo recôndita. No sucessor de “The Golden Path” (2018), a percussão assume o papel principal, pois claro, mas também há texturas e minuciosidades em harmonia com este tribalismo meditativo. Imperdível e viciante transe, este.

Carlos Lopes – Gravações [INFINITA]

Não se sabe muito acerca de Carlos Lopes. Gostava de pescar e de fazer música do passado com ferramentas do presente. Conheceu o patrão da INFINITA por obra do acaso num passeio em Vila Nova de Foz Côa e dali estaria prestes a surgir uma colaboração com a label. Mas Lopes desapareceu no rio Côa. No seu estúdio, do qual Hugo Vinagre resgatou estas duas gravações, havia de tudo: dub, funk, disco, jazz, e até folk de Trás-os-Montes. Ficamos com este cheirinho: dez minutos a não esquecer com música muito groovy e cheia de samples, textura e cor, claro está.

Homem em Catarse – Sete Fontes

Homem em Catarse diz que os lugares são as pessoas. Desta teoria, resultou um suspiro em forma de disco, um momento de tranquilidade e calma que segundo o autor se distancia do conceito de melancolia. “Sete Fontes” tem sete faixas e muitas caminhadas pelo meio, com field recordings a aproximar ainda mais cada música do sítio real que a inspirou. Ele que até agora se aventurava quase exclusivamente pela guitarra, sentou-se em frente ao piano e, no meio das suas 88 teclas, encontrou asilo para os tempos dúbios do confinamento. Nesta ode a Braga, pairam ainda camadas de eletrónica minimalista, numa ambiência imersiva que termina com a idílica Nascente do Rio Este.

Kaspar – Gestures of Release [Percebes]

Este lançamento poderia ter nascido a milhas de distância que seria igualmente merecedor de lugar nos nossos favoritos do mês. Mas nem é o caso: “Gestures of Release” surge na embaixada de João Pedro, bem no centro de Lisboa, e não conhece fronteiras. Há groove por todo o lado, uma fluidez sincera entre o house, o jazz e o disco, e não só. Uma espécie de recolhimento obrigatório da sabedoria de Kaspar, a favor do nosso deleite. Resta-nos agradecer por este rasgo que entra em nossa casa tal como a alvorada entra no clube quando a manhã está para nascer.

La Femme – Paradigmes [Born Bad Records]

É talvez o álbum mais eletrónico até à data da banda que trouxe ao mundo as misturas muito pouco sóbrias entre krautrock, surf rock e rock psicadélico com elevado teor de síntese do álbum de estreia “Psycho Tropical Berlin”. Uma pérola para fãs da música francesa, que apreciarão seguramente a homenagem que Foutre le bordel faz ao clássico “Ça plane pour moi”, de Plastic Bertrand, mas também para os apreciadores de solos excêntricos de sintetizador (Disconnexion) ou até de cowboyadas (Lâcher de chevaux e Foreigner). “Paradigmes” tem as letras de uma brincadeira pseudo-intelectual bacoca e as notas de uma fusão musical brilhantemente executada, e é precisamente isso que o torna num dos álbuns especiais deste mês.

Menino da Mãe – 20 20 [Extended Records]

Mas que autêntica bomba marcada por componentes químicos de poesia, eletrónica e punk é esta? Estamos em maio e já queremos dizer que este disco que corrói e distorce a alma é um dos melhores do ano – só para terem uma ideia do quanto gostamos de ouvir o primeiro álbum de Menino da Mãe. É algo punk, sim, mas “20 20” também é noise, drone, techno e muito mais. “Eu só acordo à noite e de ressaca”, canta o músico e poeta (!) em Ressaca. Já nós nem sequer acordamos – ainda estamos possuídos por este peculiar e deslumbrante pesadelo-que-sabe-a-sonho chamado “20 20”.

Moullinex – Requiem for Empathy [Discotexas]

“Requiem For Empathy” reflete uma nova fase de Moullinex. Com selo Discotexas, é um convite às trevas que narra uma história de saudade – no nosso caso, a saudade de dançar em pistas sobrelotadas, abafadas e, acima de tudo, felizes. Da luz, transgrediram as sombras, o brilho passou a textura e a melancolia indaga se é no escuro que nos escondemos. Neste álbum, estilos como house e instrumentos como sintetizadores entrelaçam-se cinematicamente, abrindo espaço para a colaboração artística com nomes como GPU Panic e Esktra Bonus. Do desespero fulminante, nasce uma ode à empatia e, da primeira à última faixa, deixamo-nos flutuar pelo vazio ao som de uma banda-sonora que preenche e parece sussurrar: “vai ficar tudo bem”.

Paraguaii – Propeller

Até há pouco tempo, eram uma banda de rock. Agora, é sempre a abrir com um pé na eletrónica. Paraguaii lançaram este mês “Propeller”, uma catapulta sónica para sintetizadores intrépidos e arrojados que desafiam a uma boa noite de dança. Neste álbum com sabor a algodão doce, todos os sentimentos se apaixonam e as vocais parecem fazer-se de seda. Com um toque disco e muita synthwave, imergimos na psicadélia da nova aventura sónica de Paraguaii, uma montanha-russa na qual dá vontade de andar uma e outra vez. É caso para dizer: o que é nacional é bom.

Roberto Manolio – Emilie’s Dream [Nugs on Board]

É um daqueles discos que vai forçar a entrada na mala dos selecionadores que mais gostamos de ouvir – os mesmos que são atentos e mágicos o suficiente para antecipar o efeito que um tema pode ter numa pista de dança. E, neste caso, também nos arriscamos a fazer a antevisão: este EP, sem meias medidas, e a variar entre o house e o breakbeat, apresenta uma identidade capaz de fazer as delícias daqueles que se dedicam a exorcizar os seus demónios ao ritmo das batidas quatro por quatro. E, por esta altura, eles já são tantos…

Sam Interface – Going in/Shadows [Future Bounce]

Foi naquela busca fortuita pelos meandros do SoundCloud que nos deparamos com Going In e a reação imediata foi “ui, Limewax voltou ao ativo, ou Current Value decidiu regressar às origens?”. Pelos vistos, nem um, nem outro. Foi o britânico Sam Interface que resolveu resgatar a sua costela drum’n’bass para produzir uma espécie de military step mais pausado, a fazer lembrar estes gigantes de outrora. Não queremos ser tendenciosos, mas entre esta e a outra faixa do EP, Shadows, o destaque é óbvio.

Sarnadas – The Humm [Favela Discos]

Depois de nos presentear com uma documentação do cenário experimental portuense sob a forma de “In Trux We Pux”, a Favela Discos continua em força com um brilhante disco de João Sarnadas, um dos patrões da editora que outrora assinou música como Coelho Radioativo. “The Humm” sucede a primeira parte “The Hum” e é igualmente delicioso. Tendo como base um único sintetizador de três osciladores montado por Inês Castanheira, Sarnadas volta a mostrar o resultado de dois dias de gravações: um longo e emotivo disco, marcado por uma ambiência drone arrepiante que permite sonhar, pensar e viajar. Nós e a música, até ao ponto em que ficamos alienados do tempo e espaço.

Vasco Completo – Wormhole [Monster Jinx]

Falar sobre um conceito tão subjetivo quanto tempo é sempre enriquecedor, assim como é ouvir um disco que seja ideal para ouvir do início ao fim. Juntemos as duas coisas e temos “Wormhole”, o álbum de estreia de Vasco Completo, o segundo músico português a passar com um disco sobre tempo nesta lista. Editado em versão digital e em vinil, este trabalho é um reflexo das várias inspirações musicais de Completo, que por aqui muta vozes (Lullaby for the Inebriate), vinca linhas de baixo ou cordas de guitarra ou até, pelo meio do seu génio criativo, desenha um ambiente convidativo. Isto tudo para criar um refúgio de que não queremos fugir desde o primeiro segundo de Forever.

Violet – Espírito [naive]

A desafiante Violet continua a desconstruir cânones, e a “hibridação” de géneros é algo recorrente em todo o seu espólio. É esse – e este – o espírito! O EP vale como um todo, dado à diversidade nele presente (leftfield Detroit techno, NYC tribal house, hard-house ou breakbeats são algumas das sonoridades denotadas pela própria), mas se tivéssemos de escolher, diríamos que Psyche é a figura de proa deste lançamento. Resta saber se a versão original ou o remix de Eris Drew… mas deixamos a dúvida no ar e a resposta nas vossas mãos.

Textos por Carina Fernandes, Daniel Duque, David Rodrigues, Nuno Vieira e Rui Castro

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