AUTOR

A Cabine

CATEGORIA
Artigo

Lançamentos favoritos de janeiro

9 Fevereiro, 2023 - 18:48

Começar o ano com tanta música boa? Sim, obrigada.

Dust Devices – Spine Mirror [Mera]

No regresso à Mera, à qual está ligado de uma forma ou de outra, o portuense Dust Devices assinou um dos trabalhos mais interessantes que se podem encontrar no underground nacional. Primeiro, a capacidade de Cláudio Oliveira para o design de som é bem clara. Depois, estamos a falar de um trabalho de eletrónica que bebe de música industrial ou IDM, sim, mas bem, bem metal. Tudo aqui é bom, note-se: a coesão, os riffs, os ritmos alucinantes, as ambiências alienígenas. Abram muitas alas para “Spine Mirror”, por favor. DD

Fred, Regina Guimarães – Mãos no Fogo

Poetisa portuense extraordinária, ligada aos Três Tristes Tigres e muito mais, Regina Guimarães recebeu um fã-músico em sua casa para uma sessão em que declamou uma série de poemas seus. Fred, com “um pequeno setup de gravação”, captou tudo. Daí, esteve um ano a tentar “entender o mundo de Regina e o seu”. O resultado? Ambiente daquele do mais etéreo. Instrumentos que fazem lembrar compositores contemporâneos de eletrónica clássica e moderna. Gravações de pássaros e do exterior sem deixar de ser bem interior. Jogos de vozes que até fazem lembrar XXYYXX (Explicação da Cabisbaixeza). Caminhos íntimos e convidativos. Tudo envolvido na poesia brilhante de Regina. Uma das melhores obras dos últimos anos na música portuguesa. DD

Friske – Supplier [Metalheadz]

Sempre que vemos um trabalho novo de Friske pensamos “olha, lá está o gajo a fazer das suas”. Que é como diz, “pronto, vem aí mais uma bomba”. E raramente nos enganamos. Mas com um currículo que inclui lançamentos por editoras como Architecture, Warm Communications, DSC14, Renegade Hardware ou Metalheadz, a probabilidade de acertarmos é quase certa. Neste, o incansável britânico regressa à mítica Metalheadz para debitar 5 faixas que vão agradar aos fãs de sonoridades mais dark e pesadas do jungle drum’n’bass. Poderíamos sugerir uma ou outra malha específica deste trabalho, mas é daqueles que vale bem a pena ouvir (e dançar!) de fio a pavio. RC

HIFA – Season One: Throbs [Rotten \ Fresh]

Bem mais áspero do que no antecessor “It Spreads Underground”, o baixista dos bbb hairdryer trouxe até nós “Season One: Throbs” no mês de janeiro, um trabalho com selo da Rotten \ Fresh que marca o regresso aos lançamentos de HIFA. O disco dá algumas pistas daquilo que pode ser chamado de tugacore (ouça-se Is This Tugacore): gabber, techno ou samples apetrechados (há Ciganos D’Évora em Maldita Droga, por exemplo) em violência convidativa. Tudo é rematado por um convívio de drones de sintetizadores que tanto servem para fechar em beleza como para aceitarmos o convite de voltar a ouvir o disco. Venha daí a segunda temporada. DD

Império Pacífico – Clubs Hit [Variz]

A dupla de Luan Bellussi (trash CAN) e Pedro Tavares (funcionário) não falha e “Clubs Hit” é mais uma prova de toda a beleza que há em Império Pacífico. Novamente com convidados em alguns temas – há Panda Bear! – o duo entra agora numa fase em que quer providenciar momentos de ainda maior “dança idílica” e nós temos todo o gosto em entrar na roda. Música de dança inteligente sem deixar de ter as portas bem abertas para quem a quiser ouvir. DD

Jamaimoi – Disco Phenomenon EP [funkymusic]

O sol já brilha, mas sentimos é saudades daquelas tardes calorentas de dolce dar niente bem regadas. E se vierem com uma sonoridade destas, tanto melhor. “Disco Phenomenon” é deep house, talvez não tanto para dançar efusivamente, mas para dar aquele pezinho de dança qb ou então simplesmente desfrutar. Preferimos o house sublime de Sizzling With U, com aqueles vocais subtis a dar um toque de pure bliss, à faixa homónima do EP, mas atenção que aquele snare também está qualquer coisa. RC

Kara Konchar – Devourer

Já foi Atillla, já tocou com os Névoa, já mostrou o seu lado mais gótico (que de certa forma continua presente) com este pseudónimo em “Goth Partisan”. Agora, maioritariamente de forma independente, Miguel Béco mantém a atenção virada para lançamentos como Kara Konchar. É o caso deste “Devourer”, um EP que volta a mostrar mais inclinações além das que se ouvem em trabalhos recentes, como “Karadeniz” ou “Drum & Drone”. A assinatura continua lá, mas desta vez com quatro faixas (novamente muito bem desenhadas) com grandes jogos de breaks e melodias pincelados por IDM ou trance. É ouvir e pedir por mais. DD

Nicola Cruz – Arpejos da Floresta [Highlife]

Que Nicola Cruz é um daqueles nomes bem capazes e especiais já todos sabemos. Tanto consegue pegar em vozes de funk imprimidas em viagens acid (“Vai Sentir”) como preparar o forno para servir música para a Rhythm Section International (“Self Oscillation”). As raízes da América Latina estão sempre lá, mas em “Arpejos da Floresta” parece tudo mais especial, com um lado tribal, folk e por vezes downtempo que, em certos momentos, pode até pairar num clube mais techno. Destaque inevitável para Noite Longa e para a capacidade de este tema fazer vibrar qualquer corpo e mente. DD

Rian Treanor, Ocen James – Saccades [Nyege Nyege Tapes]

Rian Treanor faz música eletrónica irreverente e claustrofóbica (mas convidativa e dançável), como podes ouvir em “File Under UK Metaplasm”, por exemplo. Já Ocen James é um instrumentista Acholi (um povo do norte do Uganda) que integra a Nyege Nyege e que toca instrumentos tradicionais de arco, como o rigi rigi que se escuta muito aqui. Juntos, compuseram este “Saccades”, um brilhante álbum a nível rítmico e melódico que abraça dois mundos distintos sem deixar de resultar numa fórmula tão complexa quanto bem conseguida. DD

Scúru Fitchadú – Nez Txada skúru dentu skina na braku fundu

Se calhar já se tornou redundante dizer que a música de Scúru Fitchádu é punk funaná original, enérgico e muito bem-vindo. É, claro, mas é muito mais. É música de dança também, é poético, é hardcore até mais não. Em “Nez Txada sk​ú​ru dentu skina na braku fundu”, Marcus Veiga assina aquela que é provavelmente a sua obra-prima, um disco indispensável para todos nós. Aproveitem e leiam esta bela entrevista que Veiga cedeu ao Rimas e Batidas enquanto sonham com ouvir temas como Ez utopiaz (que recorre a O Cigano, de Allen Halloween) no pico de uma daquelas noites bem suadas num clube. DD

Stra – Triple Point [Truth Radio]

O que é que uma faixa de drum’n’bass, uma de techno e uma de trip hop têm em comum? Aparentemente nada, não é? Mas, segundo a descrição do EP, Triple Point refere-se ao fenómeno de equilíbrio entre três estados físicos de uma substância, e esta analogia aplica-se na perfeição às faixas principais Amber, Spirit e Cloud, já que todas foram criadas a partir do mesmo ficheiro e todas partilham a mesma velocidade. Mas não descurem as outras faixas pois o house de tonalidades clássicas de Transmute e, sobretudo, o breakbeat house do remix de I Just Want That, do nova iorquino Funk Fox, também são puro gourmet. RC

Temudo – Esquece EP [CARPET/STEAM]

Já toda a gente conhece o nome e esperamos que toda a gente conheça este EP. Temudo entra em 2023 com “Esquece”, trabalho exclusivo em vinil carregado com quatro temas recheados de soul e groove em tons torrados – e até com espaço para uma faixa que dá ideias de garage com uns graves mesmo fodidos. São malhas compostas entre 2016 e 2021 que mostram a abrangência de um dos grandes produtores de techno do país. JF

VHS – PSM [Illegal Alien Records]

O produtor bracarense está de volta num EP a solo. Desta vez é lá fora, pela mexicana Illegal Alien. A estreia não podia ter sido feita de melhor forma. São 5 faixas carregadas de modernismo sónico com a sua tendência regular de synth tweaking. A assinatura de Vitor Silva nas peças é cada vez mais evidentes, assim como os grooves com texturas que aplica em cada tema. “PSM” tem espaço para ondas mentais, hipnóticas e, claro, físicas. Perder este nome é crime para quem gosta de techno. Holofotes nele. JF

Textos por Daniel Duque, João Freitas e Rui Castro. Imagem por Catarina Ribeiro.

relacionados

Deixa um comentário







t

o

p