AUTOR

Daniel Duque

CATEGORIA
Entrevista

Pixel82: “O The Grid é a tentativa de criar algo novo”

15 Julho, 2019 - 17:30

Estivemos à conversa com Pixel82 para saber mais acerca de The Grid, cuja primeira festa está agendada para esta sexta-feira 19 no Plano B.

Esta sexta-feira, o Plano B recebe a estreia de The Grid, a série de eventos que se apresenta como um novo conceito de exploração sensorial através de video mapping e de manipulação de som ao vivo. Pixel82, mente por trás do projeto e sócio do clube portuense, ficará responsável por um ‘all night dj set’ no qual pretende, aliado a um lado visual a cargo da Lyft Design, levar o ouvinte numa viagem pelas suas influências e percurso.

Filipe Galante já viveu em Londres, cidade onde começou as noites JackYaBody, que agora acontecem no Plano B. Além de dj e produtor, Pixel82, que atua este ano no Neopop e Brunch Electronik, é ainda professor, A&R da Cubo Records e dj residente e programador do espaço portuense.

Nesta entrevista, realizada no seu estúdio, Galante fala sobre o conceito desta nova noite The Grid e, entre outros tópicos, sobre o Plano B e a sua própria carreira.

Como explicarias a alguém como eu, que não conhece muito bem o conceito, o que é o The Grid?
O The Grid é basicamente a minha tentativa de criar algo novo, algo em que tenho total controlo de raíz. Já tive vários projetos como Pixel82, já apresentei live acts, dj sets, mas, mesmo assim, sinto que falta qualquer coisa. Então comecei a pensar “porque não começar um evento que, de raíz, tenho controlo sobre todos os elementos”? Isto é música, imagem; de algum modo, as sensações que são criadas e transmitidas naquele espaço – neste caso, na sala Cubo do Plano B – ser toda pensada antes do espetáculo – os visuais, nomeadamente – e depois, na noite, controlada por mim. É a ideia de criar um espetáculo audiovisual que transcende apenas um ‘all night dj set’, indo também buscar um pouco das influências de toda a minha música. Gosto um pouco de tudo, de deep house a techno, o que me permite, no contexto de um all night set, divagar e ir evoluindo pelo meu percurso e, em simultâneo, por esta componente visual forte, que ajuda a reafirmar as sensações.

Em relação a essa componente visual, se não me engano é a Lyft que está envolvida.
Sim, é a Lyft que está a desenvolver esse lado.

E isso é algo pré-programado ou…
Não, é completamente criado de raíz no momento. Existe uma data de componentes visuais já pré-programados, e eles estão comigo em tempo real a despoletar. Além disso, e de existir uma sinergia entre nós, eu tenho também algum controlo dos visuais através da mesa de mistura. Não de despoletar necessariamente, mas de controlar intensidades, luz e por aí em diante. Em sinergia com a música, claro. Por exemplo, posso adicionar um grave ou um agudo, e isso pode ter um determinado efeito nos visuais. De um modo muito natural, pois é algo que acho que é muito difícil de fazer sozinho – por isso tenho outras pessoas a colaborar comigo. Já fiz essa experiência sozinho, mas torna-se difícil apesar de ter controlo. Consigo ter algum controlo, embora esteja ali a equipa a despoletar aquilo; mas posso alterar a qualquer momento. Tenho é sempre ali o pessoal a fazer o que sabem fazer melhor.

Então és tu e a Lyft?
Exatamente. Está também envolvido o meu manager, que foi quem me ajudou a criar todo o conceito, o Maurizio Clemente, que é também manager do Kerri Chandler. Falámos sobre fazer algo novo e, tendo em conta que sou também programador do Plano B, tinha vontade de fazer algo até para este espaço. O que acontece muitas vezes é que uma pessoa está lá todos os dias, toca com frequência e acaba por cair na rotina, normal; então disse “ok, vou criar algo novo, pensado para este espaço”. O que não quer dizer que não possa acontecer noutros espaços um dia mais tarde – mas para já é no Plano B.

E achas que este lado visual tem um papel importante na cultura clubbing?
Eu acho que sim. Embora acredite que a música está em primeiro lugar, aqui trata-se sair à noite e ir ouvir um espetáculo – aliás, nem é ir só ouvir, é experienciar um espetáculo. Falo de sinestesia no sentido de ter uma relação entre dois sentidos que reforça a nossa experiência. Se eu tenho uma relação sinergética entre áudio e imagem criado de raíz, conseguimos criar uma experiência no ouvinte – ou no experienciador, digamos assim – muito mais desenvolvida do que se for apenas ouvir música ou ver imagem. Para mim, claro, a música é de onde parte tudo. Não queremos de modo algum entrar numa cultura de representatividade, é tudo bastante abstrato, como a música eletrónica o é. Não estamos a falar de música pop, com letras e figurativa. E isto tudo anda também à volta do universo Pixel. O meu nome tem alguma parte conceptual por trás, a parte computorizada. Como vês aqui [no seu estúdio], tenho uma data de hardware externo. Apesar de trabalhar muito no computador, trabalho muito com estes instrumentos reais, então a parte do conceito do espetáculo parte também um pouco sobre esta relação entre o orgânico e o digital. Além da imagem, haverá outros sentidos que queremos despoletar, mas não quero falar sobre eles para já. Ainda estou a fazer experiências sobre como despoletar mais um ou outro sentido que não é tão comum de se fazer.

Como é que encaras este lado visual? Talvez até comparando com o passado, diria que se tem observado uma aposta cada vez maior, como é caso de festivais como Neopop ou Forte. Vês como algo que continuará a evoluir?
Acho que sim. Por um lado, tens clubes underground que, por vezes, estão sem luz nenhuma, e funciona em pleno, mas, neste caso, falamos em vídeo – que são abstratos, funcionam mais como luz. Realmente acho que cada vez mais se pensa na questão da experiência, especialmente quando falamos em festivais, aí sim, o impacto é muito maior. Nesse caso, acredito que tudo irá continuar a evoluir para uma sinergia completa entre som e imagem. Especialmente num festival, quando um artista vai fazer um set de uma hora, é muito difícil mostrar quem ele é. Então realmente falamos em espetáculo imediato… se não há visuais, se não uma outra componente, então é mais difícil o público interagir do mesmo modo.

Por falar nisso, como encaras esse lado dos festivais apostarem em sets mais pequenos, não dando espaço ao dj para fazer o trabalho dele, digamos assim?
Sets de uma hora são realmente muito curtos, mas percebo o ponto de vista dos festivais. Criou-se também esta cultura, muito pelo lado da pessoa que vai ao festival, um lado mais consumista. Quando se tem um cartaz com 20 artistas, é mais fácil de vender, digamos assim. Não quer dizer que o festival queira 20 artistas com sets de uma hora cada um, mas se o público não vê os tais 20 artistas no cartaz, acha que o preço do bilhete não é justo. Acho que, muitas vezes, a culpa não é apenas dos festivais, eles estão a reagir ao mercado. E vamos ser honestos, quando há investimentos de centenas de milhares – para não falar de milhões – é preciso ter algum retorno. Enquanto artista, acho que é mais difícil passar o que se quer, mas também é um desafio. Conseguir mostrar em uma hora aquilo que somos, por exemplo com 20 faixas, é bastante difícil e é um desafio.

Voltando à The Grid, no que diz respeito ao teu set, vais prepará-lo de antemão? Ou será algo mais fluído?
Eu nunca preparo um set. A única coisa que preparo é como preparava com vinil, selecciono uma série de discos para essa noite – claro que no digital, em vez de escolher 100, posso escolher uns 300 ou 400, mas é a preparação que eu faço. Para este espetáculo, como eu refiro, há uma vertente quase histórica – não vou assumir, mas quero ir buscar coisas do passado já que estou nisto quase há 15 anos. Tenho até andado a gravar discos antigos, há essa preparação, que já está acontecer há algum tempo, no sentido de pensar sobre certas faixas que já não toco há muitos anos. A preparação vai ser um pouco por aí, de escolher algumas ideias que tenho e, depois, no próprio momento escolho o que vou tocar. A única preparação real que vai haver é que, apesar de ser um dj set, irá haver alguns momentos ao vivo [através de um sampler para o efeito]. Mas tudo acontece no momento, como um all night set. Daí é também importante eu ter algum controlo dos visuais e não ter que comunicar diretamente com quem está no vídeo para, se eu quiser um blackout por exemplo, o poder fazer.

Já agora, podemos falar um pouco sobre o Plano B. Em que é que se têm focado e quais os planos para o futuro?
O Plano B é um espaço multicultural e muito diverso, acho que é uma das coisas que nos define. Focamo-nos muito na sala Cubo com a eletrónica underground, mas temos três salas. Em cima tens a Galeria, onde podes beber um cocktail e ouvir música mais calma, temos a sala Palco, onde tens concertos até à 1 da manhã e onde pode haver um registo mais pop-rock, e temos a sala Cubo. O nosso foco tem sido dar o máximo de oportunidades a todos os artistas, e falo principalmente sobre a sala Cubo pois é a que eu programo e a que trabalho mais. Se reparares, acho que praticamente todos os artistas portugueses passam por aquela sala, de uma maneira ou outra.

Especialmente à quinta-feira, não é?
Também, sim.

E vão voltar com as noites de quarta-feira, certo?
Começámos ontem [dia 3 de julho] com um dos artistas da No, She Doesn’t e o Midi. O nosso foco sempre foi ter uma sala, onde, não interessa o dia que seja, vais lá e tens música eletrónica, house e techno de qualidade em primeiro lugar, tendo sempre um ou dois artistas internacionais por mês. Mas a nossa ideia sempre foi esta, também daí darmos oportunidade a novos artistas portugueses. O nosso foco nunca foi trazer artistas internacionais e dizer que eles é que são bons, foi sempre tentar – e, de uma maneira ou outra, acho que já conseguimos isso – dar oportunidade às pessoas para ouvir música de qualidade.

Então esse é um equilíbrio que tentam encontrar? Um equilíbrio entre convidados especiais e a cultura portuguesa?
Se reparares bem, é como te digo, o foco número um é precisamente a cultura portuguesa, os internacionais vêm em segundo lugar para nós. É claro que, musicalmente, é super interessante este novos artistas, mas de modo algum achamos que são superiores aos portugueses que nós recebemos.

Acaba por recair sobre o facto de não termos tanta oportunidade de ouvir estes internacionais…
Sim. Mais uma vez, fala-se daquela questão de venda de bilhetes, mas nós não pensamos tanto por esse ponto de vista, felizmente. É claro que também temos um limite – artistas como o Kerri Chandler não vêm todos os meses nem nada do género. E, lá está, mesmo nos internacionais, gostamos de estar num registo… Por exemplo, a Tijana é uma artista conhecida, mas não está propriamente num nível megalómano. Steve Rachmad, de todo, também anda nisto há muitos anos, mas mantém-se o mesmo. Passa um pouco por escolha de pessoas que têm muita qualidade e que temos muita curiosidade em ouvir, do que necessariamente ser viável comercialmente ou não. Isso não é propriamente o que pensamos.

E planos para a The Grid no futuro? Para já é só esta ou já há mais planeadas?
Para já estamos marcados também para o início de agosto. Isto vai ser, para já, um evento mensal no Plano B até o final do ano. Vou agora começar também – é uma das coisas que posso falar – um podcast associado a esta noite, um podcast mensal em que ou é um set gravado no momento ou algo preparado que tenha a ver com o projeto. No decurso do The Grid vão aparecer outras coisas associadas a esta vertente de sair um pouco do clube e vir para a parte musical.

Supresas, portanto.
Surpresas, sim. É um projeto que está planeado a um ano mais ou menos, mas por isso é que ainda não quero falar de tudo, os planos ainda estão a ser traçados. Para já começa neste espetáculo e começa com all night sets meus apenas, mas não quer dizer que seja esse formato para sempre.

Já agora, podemos conversar sobre o teu trabalho como Pixel82. Depois de lançares o Neo EP no final do ano passado, tens planos para os próximos tempos ou não pensas muito nisso?
Sim. Posso dizer que tenho quatro discos praticamente prontos, mas estamos a ver com que editoras devemos trabalhar. Este ano, sou honesto, foi um ano de muita preparação, de ficar fechado no estúdio – tenho este estúdio há cerca de um ano. Foi um ano de fechar-me aqui, usar tudo o que tenho e focar-me em criar, sem pensar muito no que irá sair cá para fora. Acredito que no final deste ano e início do próximo vou ter edições bastante regulares. Se calhar vai haver algo para ouvir da Cubo Records ainda este ano – um projeto associado ao Plano B do qual sou A&R – e é como digo, tenho muita coisa na calha que está em processo de finalização.


É fácil encontrar um equilíbrio entre Plano B, djing e as tuas outras atividades?
Eu vejo a música – eu dou aulas também, há muitos anos – em primeiro lugar como uma paixão. Depois eu fui afortunado, um sortudo em conseguir transformar isto numa profissão. E eu vejo isto como algo de 360º; eu produzo, eu sou dj, eu sou programador do espaço. O que é que acontece? Todas estas ideias acabam por se influenciar umas às outras, até porque ideias que tenho para a programação vêm do meu trabalho como dj ou de artistas de que gosto. Artistas que vejo no Plano B e noutros locais que podem influenciar-me. Por vezes até alunos, miúdos novos que têm coisas que eu próprio ainda não percebi. É fácil de conciliar, no sentido em que tudo se influencia, claro que com as suas separações óbvias, mas a base disto tudo é a música, o gosto por mostrar e fazer música. Portanto… a gestão de tempo pode não ser fácil – à semana acordo às 8h, depois ao fim-de-semana deitamo-nos às 7h – mas estou contente com o que faço.

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